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MP não pode celebrar acordo de colaboração premiada com pessoa jurídica

Como não se mostra possível enquadrar pessoa jurídica como investigada ou acusada por crimes de organização criminosa, o Ministério Público não pode com ela celebrar um acordo de colaboração premiada.

Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso em Habeas Corpus ajuizado para trancar ação penal contra um ex-assessor de secretário de logística do governo de São Paulo.

O réu foi representado na ação pelo escritório Pavan Lapetina e Silveira Advogados.

Ele foi denunciado por lavagem de dinheiro e organização criminosa, após ser delatado por ex-executivos da Camargo Corrêa por ilícitos no âmbito de licitação do metrô paulista. Estes, por sua vez, tornaram-se colaboradores ao aderirem a um acordo de colaboração premiada firmado pela própria construtora.

Segundo o réu, o acerto da Camargo Corrêa com o Ministério Público de São Paulo é ilegal, pois a empresa, como pessoa jurídica, não tem capacidade e voluntariedade para firmar acordo de colaboração premiada, conforme previsão da Lei 12.850/2013.

Ao analisar o caso, o Tribunal de Justiça de São Paulo afastou a argumentação. Para a corte, a pessoa jurídica é sujeita de direitos, capaz de expressar sua vontade de forma destacada e autônoma em relação à vontade das pessoas naturais que a compõem.

O TJ-SP apontou que a Camargo Corrêa é detentora de informações e dados relevantes sobre os supostos crimes e estrutura da organização criminosa. E apontou que, se a legislação penal nada dispôs sobre a colaboração premiada da pessoa jurídica, é porque não a proibiu.

O tema é inédito no STJ. Relator, o desembargador convocado Olindo Menezes propôs a reforma do acórdão e o trancamento da ação. Nesta terça-feira (9/8), em voto-vista, o ministro Rogerio Schietti acompanhou a conclusão. A votação na 6ª Turma, por fim, foi unânime.

Sem crime, sem delatação

Para o desembargador convocado, nunca houve dúvida na jurisprudência e na doutrina quanto à capacidade ou autonomia da pessoa jurídica para firmar compromissos e agir voluntariamente. Isso não significa que possa celebrar acordo de colaboração na área penal.

Isso porque a delação é ato personalíssimo, cujo objetivo é obter a redução ou mesmo a isenção da pena do colaborador por algum crime cometido. Acontece que a pessoa jurídica tem responsabilidade penal muito limitada, restrita aos crimes ambientais, por força constitucional.

Assim, o instituto da delação premiada não se aplica à Camargo Corrêa, enquanto empresa. Principalmente para delatar seus próprios executivos, pessoas físicas a quem a lei confere o direito personalíssimo de firmar acordo para admitir a prática de crimes eventualmente praticados.

"Como não se mostra possível o enquadramento da pessoa jurídica como investigada ou acusada no tipo de organização criminosa, também não seria licito qualifica-la como ente capaz de celebrar acordo de colaboração premiada, menos ainda em relação aos seus dirigentes, aos quais pertence essa opção personalíssima", disse o desembargador Olindo Menezes.

É delação ou é leniência?

O voto ainda aponta que o acordo firmado pela Camargo Corrêa com o MP-SP mistura dois institutos: da colaboração premiada e da leniência. O primeiro se restringe às acusações penais. O segundo é aplicável à pessoa jurídica, mas em outros âmbitos: na área cível ou administrativa.

Para o desembargador convocado, as leis que tratam desses dois institutos devem ser interpretadas restritivamente, exceto se for para beneficiar o réu. Ou seja, não se aplica a posição do TJ-SP segundo a qual a colaboração premiada da pessoa jurídica seria possível porque a lei não a proibiu.

"Ou se tem uma colaboração premiada baseada na lei 12.850/2013, com todas suas regras, ou um acordo de leniência, seja com base na Lei 12.846/2013 ou mesmo na lei 12.529/2011", concluiu.

Restando nulo o acordo firmado entre Camargo Corrêa e MP-SP, cai também a delação feita por adesão por alguns dos executivos da empresa. Logo, não há outros elementos que possam embasar a ação penal contra o réu, o que leva ao trancamento da mesma.

Fonte: ConJur