O Estado assume a tutela do preso, devendo cuidar sempre da preservação da sua integridade fÃsica e mental, com a devida diligência à s pessoas com deficiência.
Com base nesse entendimento, o juiz Alexandre Moraes da Rosa condenou o estado de Santa Catarina a indenizar a famÃlia de uma mulher que cometeu suicÃdio em uma unidade prisional catarinense.
A detenta sofria de transtornos mentais e, apesar de sua mãe ter alertado as autoridades sobre a necessidade de acompanhamento, foi deixada sozinha em uma cela.
Ao analisar o processo, o magistrado entendeu que o caso deveria ser encarado sob a ótica da teoria objetiva, uma vez que a mãe da mulher informou sobre seu estado de saúde já na delegacia de polÃcia e, apesar disso, os agentes penitenciários não tomaram os cuidados necessários para garantir a integridade fÃsica da detenta.
O julgador lembrou que a jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina é clara no sentido de que é assegurado aos presos o respeito à integridade fÃsica e moral (artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal).
"Além disso, o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal estabelece que 1as pessoas jurÃdicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa", assinalou.
Ele ponderou que, por causa de um entendimento do Supremo, que, em sede de repercussão geral (Tema nº 592), estabeleceu que o estado poderá ser dispensado de indenizar se conseguir provar que a morte do detento não podia ser evitada, seria necessário analisar se os fatos narrados no processo preenchem os requisitos de responsabilidade objetiva.
Após revisitar os depoimentos dos agentes e dos médicos que acompanhavam a mulher, o magistrado entendeu que o conjunto probatório apresentado não apontou nexo de causalidade entre a atuação das servidoras lotadas da unidade prisional e o suicÃdio da detenta. Ele, contudo, explicou que o estado deveria ser julgado sob a perspectiva da omissão relativa ao manejo de deficientes.
"As perguntas a serem respondidas são: (a) o Estado tinha informações sobre a condição mental? (b) Se sim, na condição de presa em flagrante, demandava atendimento compatÃvel com a sua condição? (c) Se sim, o tratamento foi efetivado? (d) Se não, vincula-se ao evento morte?; e, (e) Se sim, cabe indenização moral e material? As respostas, antecipa-se, são favoráveis à autora".
O juiz explicou que o estado é um só, com agências diversas, motivo pelo qual a omissão da gestão da informação sobre pessoas com transtorno ou deficiência mental, por ineficiência, desÃdia, conveniência ou má-fé, autoriza a responsabilização do ente por omissão especÃfica.
Ele lembrou que o Conselho Nacional de Justiça há muito tempo tem alertado para o desrespeito a portadores de transtornos mentais e, por isso, incorporou diversas iniciativas, entre elas o tema "Quebrando os Muros que Impedem a Efetivação da Lei Antimanicomial".
"A versão oficial do suicidio na UPA é conveniente. É verdade que os agentes estatais, por desconhecimento, ausência de treinamento ou de protocolos adequados, não poderiam realizar muito mais do que seguir as normativas. A questão é a omissão estrutural do Estado, configurada no caso concreto", delimitou o juiz.
Ele afirmou que a depreciação moral da detenta é incompatÃvel com a PolÃtica Nacional de Proteção de Drogas e, também, de deficientes que, por básico, precisam de suporte do estado, mas são desprezados pela lógica bélica acostumada com a condenação a priori de todos que usam ou aparentam usar droga.
Por fim, ele chegou à  conclusão de que, ao entrar no sistema prisional, a detenta foi abandonada pelos agentes estatais, que deveriam saber de sua situação porque o estado já a atendia pela rede de saúde. Diante disso, ele determinou que o estado de Santa Catarina reembolse as despesas do funeral da mulher e estipulou em R$ 20 mil a indenização por danos morais.
Fonte: ConJur