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Juiz aplica retroativamente prescrição da nova LIA a sentença transitada em julgado

Com base na retroatividade da lei mais benigna ao réu, a Vara Única de São Bento (PB) utilizou o texto da nova Lei de Improbidade Administrativa para reconhecer a prescrição intercorrente em uma ação de improbidade transitada em julgado e extinguiu as penas impostas a um ex-prefeito do município — exceto o ressarcimento ao erário.

O juiz José Normando Fernandes considerou que a prescrição deveria ser aplicada mesmo com a sentença transitada em julgado para evitar afronta à isonomia. "No caso onde dois indivíduos praticaram condutas idênticas, um estaria sendo punido com a suspensão dos seus direitos políticos e outro não, apenas por terem praticados as condutas em tempos distintos", exemplificou.

O caso

O Tribunal de Contas da Paraíba havia constatado no município anormalidades em licitações, emissão de cheques sem fundos, aplicação irregular de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), inexistência de lei instituidora do cargo de tesoureiro, falta de escrituração da dívida flutuante no balanço patrimonial e pagamento de salários inferiores ao mínimo nacional.

A partir disso, o Ministério Público estadual ajuizou ação para questionar o superfaturamento de preços na aquisição de um chassi e o pagamento de vencimentos a servidores com nomeações consideradas ilegais pelo TCE-PB.

Em primeira instância, o ex-prefeito foi condenado às penas de suspensão dos direitos políticos por seis anos, perda da função pública, proibição de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios por cinco anos e multa civil de R$ 10 mil. A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça estadual e, mais tarde, foi certificado o trânsito em julgado.

A defesa, feita pelo escritório Cabral Advogados Associados, pediu a aplicação dos prazos prescricionais mais favoráveis ao réu, trazidos pela nova Lei de Improbidade Administrativa, de outubro de 2021. Já o MP argumentou que tais prazos só poderiam ser aplicados com base em marcos interruptivos ocorridos após a entrada em vigor da norma.

Fundamentos

Fernandes apontou que "a prescrição é instituto de Direito Material e não de Direito Processual". Assim, os novos princípios reguladores poderiam ser estendidos ao exame de ações de improbidade administrativa ajuizadas antes da nova legislação.

Além disso, a própria nova LIA estabelece a aplicação dos "princípios constitucionais do Direito Administrativo sancionador" ao sistema de improbidade. O juiz lembrou que, de acordo com a jurisprudência, aplicam-se ao Direito Administrativo Sancionador os princípios fundamentais do Direito Penal, entre os quais a retroatividade da lei mais benéfica.

A nova LIA estipulou que a interrupção da prescrição gera a contagem de novo prazo a partir da mesma data, porém por quatro anos — metade do prazo original de oito anos. Entre os marcos interruptivos estão o ajuizamento da ação, a publicação da sentença condenatória e a publicação da decisão de segunda instância que confirme a sentença condenatória ou reforme sentença de improcedência.

No caso concreto, a ação foi ajuizada em 2002 e a sentença condenatória, publicada em 2020, com confirmação pelo TJ-PB em 2021. Ou seja, transcorreram mais de quatro anos entre os dois primeiros marcos.

Porém, o magistrado ressaltou que a prescrição não alcança a pena de ressarcimento ao erário, conforme tese de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (RE 852.475, Tese 897).

Fonte: ConJur