A procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, encaminhou parecer ao STF no qual opina pela procedência de pedido feito em ADIn que questiona a lei 13.465/17 – sobre a regularização fundiária rural e urbana. Para a PGR, a norma avança sobre competência dos municípios e reforça desigualdade social.
A norma, sancionada em julho de 2017, dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos a assentados da reforma agrária e sobre a regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal, além de instituir mecanismos para aprimorar a eficiência de procedimentos de alienação de imóveis da União.
Na ADIn 5.883, o Instituto de Arquitetos do Brasil, requerente, alega a inconstitucionalidade da lei na parte que trata da regularização fundiária urbana, por entender que os dispositivos afrontam o modelo constitucional de política urbana e é incompatível com a proteção constitucional da propriedade, a competência comum para conservação do patrimônio público, a função social da propriedade na ordem econômica, entre outros pontos.
Ao opinar pela inconstitucionalidade dos dispositivos, a PGR salientou que a CF/88 consolidou o papel central das municipalidades no planejamento da política urbana e na elaboração do plano diretor, sendo que ela define a competência concorrente da União, dos Estados e do DF para tratar sobre o direito urbanístico cabendo ao primeiro ente a criação de normas gerais.
“No sistema constitucional de repartição de competências, à União cabe o delineamento geral do direito urbanístico com o estabelecimento de diretrizes, de maneira que haja espaço para a atuação do Município, a quem cumpre adequar o regramento geral às particularidades locais.”
Segundo a PGR, a competência da União e dos Estados possui dimensão interurbana, de caráter nacional, regional e estadual. Por outro lado, a competência municipal é intramunicipal e exclusiva no que se refere à elaboração do plano diretor, limitada pelas diretrizes gerais da lei Federal, não cabendo, portanto, a interferência da União e dos Estados, ressalvada a legislação sobre diretrizes gerais.
A PGR entendeu que, com o intuito de definir novo regramento sobre regularização fundiária urbana, a lei 13.465/17 não respeitou o protagonismo municipal sobre o tema e extrapolou a competência da União para editar normas gerais. Assim, resta evidente a necessidade de espaço para a atuação legislativa dos Municípios, sob pena de afronta à sua autonomia e às normas constitucionais de política urbana.
Desigualdade social
No parecer, a PGR sustentou que “a propriedade representada pela titularidade formal do bem indica a relação entre seu titular e a coletividade de pessoas”, sendo a função social da propriedade condicionada por esses atributos.
Segundo a Procuradoria, o artigo 9º da lei 13.465/17 “sequer menciona a regularização fundiária como instrumento para garantia do direito à moradia, o que resulta na possibilidade de regularização para finalidades diversas”, como fica explícito em seu artigo 23.
Assim, a PGR pontuou que a lei usa a regularização fundiária urbana como forma de privatização da cidade por meio da distribuição de títulos de propriedade, sendo que, o regime estabelecido por ela contribui para a concentração de terras e, portanto, caminha no sentido oposto aos objetivos fundamentais da República, relacionados à construção de sociedade livre, justa e solidária, ao desenvolvimento nacional e à erradicação da pobreza, à redução das desigualdades sociais e regionais.
Dessa forma, opinou pela procedência do pedido feito pelo requerente na ação.
Processo ADIn 5.883.
Fonte: Migalhas.