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Gilmar suspende ação civil baseada nos mesmos fatos de ação penal trancada

O Ministério Público não pode apresentar ação civil pública baseada nos mesmos fatos que constavam de uma ação penal que já foi trancada, sob pena de incorrer no bis in idem — repetição de julgamento em duas esferas diferentes.

Assim, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminar para suspender a indisponibilidade dos bens do ex-deputado estadual em São Paulo Fernando Capez. A decisão também sobrestou a ação civil pública na qual Capez é réu.

A concessão da liminar se deu em sede de uma reclamação no STF. Isso porque uma decisão anterior da Corte já havia trancado uma ação penal referente à suposta participação de Capez na chamada "máfia da merenda". O fundamento dessa decisão de trancamento foi que o ex-deputado não era autor dos fatos a ele imputados.  

No entanto, a defesa de Capez entendeu que, baseando-se nos mesmos fatos objeto da ação penal trancada, o MP ajuizou uma ação civil pública, no seio da qual se deu a indisponibilidade de bens. Assim, acionou o STF com a reclamação — meio de impugnação destinado justamente à garantia da autoridade da Corte.

Capez, que atualmente é diretor executivo do Procon-SP e foi deputado estadual por três mandatos e presidente da Assembleia Legislativa de SP, foi defendido por Alberto Zacharias Toron.

Independência mitigada

O ministro Gilmar Mendes não apenas reconheceu que os fatos constantes das duas ações — a penal (trancada) e a civil pública — são os mesmos, mas também identificou que chegam a ter a mesma literalidade textual — uma espécie de "copia e cola". "Verifico que existe não só identidade do acervo fático-probatório referido nos procedimentos, mas também franca duplicação da narrativa, por vezes utilizando as mesmas palavras", disse.

Feito isso, restaria saber se os mesmos fatos podem ser apreciados penal e civilmente de maneira apartada. Em outras palavras, se pode em tese haver uma repetição (o chamado bis in idem): uma vez superada a esfera penal (trancamento da ação), pode-se passar à esfera do Direito Administrativo sancionador?

A resposta de Gilmar Mendes é que a independência entre as duas esferas — penal e administrativa — deve ser interpretada como mitigada.

A mitigação ocorre porque, por um lado, decisões tomadas no âmbito penal não podem ser revistas civilmente, pois o escrutínio do processo penal é sempre mais rigoroso. O contrário, no entanto, não é verdadeiro: a compreensão dos fatos feita pela Justiça no âmbito do Direito Administrativo sancionador pode e deve ser revista pelo Direito Penal — daí a mitigação.

"A adoção de uma noção de independência mitigada entre as esferas
penal e administrativa — esta parece ser a posição mais acertada diante
dos princípios constitucionais reitores do sistema penal, principalmente
da proporcionalidade, da subsidiariedade e da necessidade — na
interpretação da lei de improbidade administrativa (Lei 8.429/92),
sobretudo do artigo 12, nos leva ao entendimento de que a mesma narrativa fático-probatório que deu ensejo a uma decisão de mérito definitiva na esfera penal, que fixa uma tese de inexistência do fato ou de negativa de autoria, não pode provocar novo processo no âmbito do direito administrativo sancionador", afirmou Mendes.

Reclamação nº. 41.557.

 

Fonte: Conjur.